Drive my car

      É raro termos contato com produções nipônicas para o cinema, talvez por uma simples questão de pesquisa mesmo.

    O ganhador do Oscar de melhor filme estrangeiro desse ano é japonês.

    O streaming trouxe a possibilidade de assistir outro filme indicado, em mais um serviço que não conhecia, o Mubi.

    A experiência não teve custos, pois fornecem um período para experimentar, mas o catálogo é bem restrito e são todos filmes de países alternativos à grande meca hollywoodiana.

    O filme é centrado no ator Kafuku e suas perdas familiares, que primeiro o afastam da TV e depois do teatro, passando a dirigir a peça Tio Vânia de Chekhov que interpretava como personagem principal.

    O desenvolvimento dos personagens é denso e envolvente, vemos a estória de amor interrompida chegar a um termo com uma revelação em forma de estória, como um legado do além.

    O texto da peça é citado várias vezes e algumas pode até confundir com falas da vida do personagem, como um trecho em que fala que tem 47 anos...

    A compreensão do filme exige atenção, mas é o típico filme que a academia gosta, com atores interpretando com maestria uma estória que pode ser considerada quase comum.

    SPOILER

    Começando com uma cena de sexo com o casal Kafuku e Oto, vemos que ela começa a contar uma estória que saiu de sua imaginação nesse momento.

    No dia seguinte, percebemos que ela não lembra da estória e pede pro marido recontar, tomando anotações no smartphone, chamando a atenção o modo de escrita totalmente diferente do ocidental.

    Uma cerimônia fúnebre budista nos revela que o casal perdeu a filha, mais tarde, Kafuku explica que ela morreu de pneumonia com 4 anos e nessa cena, já fazia 17 anos que enfrentavam essa dor insuperável.

    Temos um vislumbre da peça de Chekhov, uma parte até cômica dessa pesada estória.

    Conhecemos então o ator que trabalha interpretando o roteiro de Oto, sim, os trechos que fala com o esposo são escritos e desenvolvidos para esse formato.

    Kafuku sai para uma viagem, mas ao chegar no estacionamento do aeroporto, recebe uma mensagem informando que seu vôo foi adiado devido às condições climáticas e ele pode se hospedar no hotel próximo ao aeroporto.

    Resolve voltar pra casa, mas ao abrir a porta, escuta com preocupada e atônita surpresa, os gemidos da esposa. Caminha lentamente para ver a cena de sexo no sofá de sua sala.

    Sai silenciosamente e se hospeda no hotel, escondendo de Oto o que presenciou.

    Descobrimos que Kafuku está com glaucoma ao sofrer um acidente de carro, onde não viu o outro se aproximar.

    O tempo passa, mas é difícil conviver com a dor da traição, incomodado com os pensamentos em casa com a esposa, resolve sair inventando uma desculpa, Oto pede pra conversar com ele quando voltar...

    Demora a retornar, fica andando de carro sem rumo e só chega em casa tarde da noite, ao acender a luz, encontra a esposa caída no chão da sala.

    O templo budista volta a cena, agora para a cerimônia de enterro de Oto.

    O tempo passa, dois anos e vemos Kafuku dirigindo para Hiroshima.

    Descobrimos que vai dirigir a peça de Chekhov que tanto conhece, mas a direção local lhe informa que é obrigatório um motorista para ele, devido a um acidente ocorrido há anos.

    Sua recusa é imediata, mas o diretor assistente o convence a testar, ainda assim, só aceita quando a motorista insiste e lhe dá a opção de tomar o volante caso não goste de sua direção.

    Pediu uma hospedagem distante do teatro, assim a viagem leva uma hora e o hotel fica em uma ilha cenográfica muito tranquila.

    Ao verificar os candidatos a atuar, encontra o ator amante da esposa.

    Dá-lhe o papel principal, vimos também a inclusão de uma atriz muda, que se comunica com a lingua de sinais coreana.

    A peça é interpretada por atores de vários países, assim a multilinguagem é característica de destaque, com legendas apresentadas numa tela acima do palco.

    Várias conexões são reveladas, coincidências doloridas, por exemplo, a motorista é uma jovem de 23 anos, que seria a idade da filha dele se estivesse viva, a atriz muda é esposa do diretor assistente, o amante vive um escândalo por se envolver com uma menor e reage violentamente quando os curiosos tiram fotos suas, ele também conhece a continuação da estória que Oto contou por ultimo para seu marido.

    Essa revela que ela sabia que fora descoberta e sofria com a culpa por ter matado o amor que seu marido lhe devotava.

    Kafuku acaba encurralado entre interpretar novamente o personagem que lhe causou tanta dor ou encerrar a peça, quando o amante é preso por causar a morte de um dos fotógrafos indesejados.

    Pede pra conhecer a vila onde a motorista morava e de onde ela carrega a culpa de deixar a mãe morrer.

    Vemos um pouco da paisagem rodoviária do Japão, além da vila pequena e pobre onde finalmente se entrega aos sentimentos e revela toda sua dor.

    O texto de Chekhov novamente se mescla a fala do filme e a conclusão de que é preciso continuar a viver.



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